sexta-feira, 9 de julho de 2010

FAZENDO A BARBA...



Acabara de me barbear.
Senti que tinha a barba mal feita, através da passagem da mão esquerda pelo rosto, embora o espelho, na minha frente, não me permitisse detectar esse facto.
O recurso aos óculos, que deixara em cima da mesa-de-cabeceira, permitiu-me perceber duas tristes realidades:
A barba estava, efectivamente, mal feita e a minha vista já não me permitia que me escanhoasse como antigamente, sem o recurso àquele par de vidrinhos, alinhados horizontalmente.
Lembrei-me do meu pai.
Não sei, exactamente, o momento em que ele começou a usar óculos. Mas tenho a nítida lembrança do dia em que, ao beijá-lo, lhe fiz a observação:
-Pai, tens a barba mal feita!
A resposta não se fez tardar, com um sorriso, um daqueles sorrisos que só o meu pai sabia fazer, sorrindo com o rosto todo:
-Pois é, filho, sem óculos já não vejo nada. Deixa lá...
Vai longínquo esse dia, talvez tenham passado uns trinta anos, não sei, mas, agora, sei que chegou a minha vez.
Por isso, meu querido filho, se me vires barbeado ás três pancadas, já sabes que se tratou de mais uma tentativa, vã, é certo, para evitar recorrer aos óculos. Mas a idade tem destas coisas...
Para ti, meu querido e velho pai, apesar de já não poder partilhar contigo a sensação, quero que saibas, onde quer que estejas, que, agora, entendi o que me querias dizer com aquele "deixa lá"...
Finalmente, percebi o pleno significado do que me disseste naquele dia:
Esta coisa de ter que fazer a barba com óculos é uma enorme maçada!

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