quinta-feira, 5 de agosto de 2010

JUSTIÇA, SINDICATOS E...POLÍTICA


Para nosso desgosto, tornou-se indesmentível que a Justiça portuguesa anda pelas ruas da amargura.
Embora não sendo uma novidade, os diferentes protagonistas têm-se recusado a enfrentar a realidade, preferindo um discurso "politicamente correcto", uma moda que se estende a quase todos os sectores da sociedade, desde a política ao futebol.
Na Justiça, como na sociedade portuguesa, em geral, abraça-se e elogia-se, pela frente, e diz-se mal e esfaqueia-se, pelas costas.
Um hábito antigo, que muitos "democratas" se têm empenhado em refinar...
Salvo honrosas excepções, como é o caso do Bastonário da Ordem dos Advogados, Marinho Pinto, os problemas da Justiça são tratados como se, intervenientes e comentaristas, ignorassem o que se tem, de facto, vindo a passar, preferindo acobertar as suas opiniões, através do recurso à estafada expressão "acredito no funcionamento da justiça portuguesa".
Eu, confesso, não sei se acreditam, ou não, mas, para quem tiver ocasião de os ouvir em privado, fica difícil acreditar que assim seja. Adiante...
A verdade é que, a propósito do caso Freeport, estalou o verniz à nossa magistratura, não me parecendo possível que se possa continuar a fingir, como até aqui, que está tudo bem.
A carta aberta que o Sindicato dos Magistrados do Ministério Público dirigiu ao Procurador-Geral da República, depois de este os ter acusado de se comportarem como um pequeno partido político, com agenda própria, é bem o exemplo do actual estado de coisas...
Não sei se é preciso, ou não, dar mais poderes ao Procurador-Geral da República, tanto mais que, apesar do interesse que este assunto me merece, as opiniões que tenho ouvido, de especialistas e comentadores, pouco têm contribuído para o esclarecimento do tema. Bem pelo contrário...
Mas inclino-me no sentido de respeitar as opiniões de Proença de Carvalho, na sua qualidade de iminente jurista e profundo conhecedor do sistema. Assim como as de Maria José Morgado, cuja isenção e competência poucos se atrevem a contestar, e para quem o Estatuto do Ministério Público estabelece uma falsa autonomia do Procurador-Geral da República.
Se Proença de Carvalho tiver razão, não só é necessário rever os poderes do Procurador-Geral da República, como se deve extinguir o Conselho Superior do Ministério Público, passando o Presidente da República a ter um papel mais interveniente, podendo, inclusive, vir a presidir ao Conselho Superior da Magistratura.
Não sendo um especialista na matéria, admito que a proposta merece a minha simpatia...
Já quanto à existência de um Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, atrevo-me a firmar que é uma verdadeira aberração, como já tive ocasião de escrever num "post" anterior, só explicável pelos interesses de alguns, e pela complacência de muitos...
Em meu entender, é imperioso que Governo e Oposição não politizem este tema, e sejam capazes de, em articulação com o Presidente da República, apresentarem as propostas adequadas, tão rapidamente quanto possível, para que se possa pôr termo ao estado de pouca vergonha a que se chegou.
A Justiça, um dos pilares da nossa democracia, é a principal responsável por muitos dos problemas com que se debate a sociedade portuguesa, pela sua morosidade e pela imagem que tem dado de si própria, nomeadamente em matéria de independência e isenção...
Não ignoro, contudo, que os magistrados são homens e mulheres, como nós, com as suas forças e fraquezas, as suas preferências e simpatias, de diversa natureza. Clubistas, partidárias ou outras.
Pelo que, se não houver um sistema que possa dar garantias aos portugueses, de que a Justiça está ao abrigo dos interesses, preferências, ou simpatias, dos magistrados, que Deus nos acuda...
E o que transparece da actuação dos dois Procuradores, encarregues do caso Freeport, está longe de nos assegurar que tenha existido isenção nos comportamentos...
Como afirmou Proença de Carvalho, a propósito da inclusão das célebres 27 perguntas, no despacho de arquivamento, "a motivação não pode ser jurídica". Tanto mais que, segundo ele, "é um acto inútil" e, como tal, "proibido por lei".
E depois de tudo o que tenho ouvido, e lido, inclino-me a admitir que Proença de Carvalho possa ter razão quando afirma que, "a conclusão não agradou aos senhores Procuradores".
O que, a ser verdade, nos permite concluir, como faz Proença de Carvalho, que a colocação das perguntas no despacho, apenas teve como finalidade "servirem de pasto a especulações".
E porque vou envelhecendo, começo a duvidar, cada vez mais, das coincidências, pelo que não posso deixar de me interrogar sobre quem serão os eventuais beneficiários daquele despacho e a quem aproveitou a eclosão, mediática, e sua perpetuação, em torno do caso Freeport...

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