segunda-feira, 21 de setembro de 2009

PORTUGALIS...



Era um navio da FCE (Frota da Comunidade Europeia), o Portugalis, que atravessava um período conturbado, quer por problemas de organização interna, quer porque o mar encapelado, um pouco por todo o lado, estava a causar estragos em todas as embarcações da frota...
O comandante, eleito há 3 anos, zangara-se com o imediato, a propósito da definição da melhor rota para os Açores, e parecia disposto, agora que se aproximava a data da escolha do novo imediato, a influenciar a sua futura eleição.
Isto apesar do Código da Marinha garantir a independência do comandante em processos eleitorais e exigir a sua isenção.
A tripulação, que se organizara em grupos, em função dos seus interesses, não parecia muito empenhada no processo eleitoral que se aproximava, apesar da importância da escolha.
Afinal, já tinham sido tantos os comandantes, e imediatos, e tantas as promessas por cumprir, que uma parte significativa admitia abster-se na próxima votação, tal como tinha acontecido na eleição para o ECSP (European Community Shipping Parliament).
Mas voltando ao Portugalis, a agitação era enorme, com acusações permanentes, ao imediato, que iam desde o possível recebimento de comissões pela aprovação do embarque de mercadorias, num “freeport”(porto livre), até á espionagem do camarote do comandante, ainda que nenhuma delas comprovada. Houve, até, quem sugerisse que comprara a sua carta de marear, pretendendo desqualificá-lo para o exercício da função...
As medidas de racionalização que o imediato tomara, logo após a sua nomeação, em matéria de saúde, ensino, e justiça, entre outras, foram extremamente impopulares para os sectores mais poderosos da tripulação, pouco habituados, e contrários, a tudo o que fossem verdadeiras reformas, e isso contribuíra para aumentar os seus opositores...
Claro que o mau feitio, e arrogância, do imediato facilitaram o seu decréscimo de popularidade, sendo certo que, caso volte a ser escolhido, não conseguirá o apoio da maioria, absoluta, da tripulação.
A principal concorrente do imediato era a oficial da messe, que já integrara o conselho de oficiais, ao tempo em que o actual comandante exercera funções de imediato.
A sua candidatura, a princípio incipiente, ia ganhando força junto da tripulação, não tanto pela sua acção, mas por omissão, seguindo o velho ditado segundo o qual “burro calado passa por esperto”.
Aliás, começava a ser voz comum, entre a tripulação, que, cada vez que a oficial da messe abria a boca, ou entrava mosca, ou saía asneira...
Alguns boletins diários, com destaque para o Publimaris, percebendo a fase descendente do imediato, junto da tripulação, encarregavam-se de acentuar a pressão, seguindo um princípio que, embora contrário ao direito, funciona perfeitamente em política, ou seja, na dúvida, contra o réu...
E o comandante, percebendo o momento favorável, não só optou por gerir, cuidadosamente, os seus silêncios, como decidiu influenciar a campanha, em favor da oficial da messe, com a estória das escutas ao seu camarote...
Só que, num gesto pouco comum entre os boletineiros, o Noticialis, um boletim muito lido a bordo, resolveu publicar provas do envolvimento do comandante, e dos seus próximos, na tentativa de comprometer o imediato nas escutas, envolvendo, também, o director do Publimaris no processo...
A confusão foi total total, havendo até quem diga que a imagem do comandante ficará seriamente abalada com este episódio, sobretudo depois de ele se recusar a esclarecer o seu envolvimento, antes da escolha do novo imediato...
Acordei !
Afinal, estava a sonhar...
Não sei o que originou este sonho, mas tenho a certeza que alguma semelhança com a realidade só pode ser mera coincidência...

1 comentário:

  1. Mais uma metáfora perfeita servida num texto delicioso.
    Excelente, Parabéns!

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