quarta-feira, 20 de abril de 2011

ASSIM NÃO VALE...


Na sua edição de hoje, o jornal Diário Económico divulga os resultados de uma sondagem da Marktest, sob o título "Portugueses apontam Sócrates como maior culpado da crise", em artigo assinado por Francisco Teixeira, que passo a reproduzir:

Uma esmagadora maioria de portugueses (86%) critica a actuação do Governo e do Presidente durante a crise.

A esmagadora maioria dos portugueses considera que o Governo deveria ter reagido mais cedo à pressão insustentável dos mercados financeiros e que o Presidente da República deveria ter sido mais activo ao longo da actual crise financeira. Em ambos os casos, 86% dos portugueses inquiridos pela Marktest dão nota negativa ao comportamento de Sócrates e Cavaco Silva.
Este estudo qualitativo realizado para o Diário Económico e TSF retrata o actual momento que o País atravessa e aponta as soluções políticas que devem sair das próximas eleições.
Entre as personalidades com responsabilidades políticas em Portugal, o primeiro-ministro é apontado como o principal responsável (65%) pela actual crise. E ao contrário do que ainda hoje garante o líder socialista, o PEC IV apresentado pelo Governo não era solução: 67% dos inquiridos garante mesmo que não evitaria um pedido de ajuda externa caso a oposição, a 23 de Março, tivesse viabilizado a actualização do Programa de Estabilidade e Crescimento que o Governo colocou a votos no Parlamento.

Como primeira constatação, começo por fazer notar que, quem fez o título da notícia optou por poupar Cavaco, ao desagrado dos portugueses, embora isso não seja nada a que não estejamos habituados.
Afinal, bater no suspeito do costume, na actual conjuntura, rende, porque "é fácil, é barato, e dá milhões", para usar o "slogan" publicitário conhecido...
Mas quem se der ao trabalho de ler o corpo da notícia poderá verificar duas coisas:

- O título da notícia está construído para prejudicar a imagem do primeiro ministro;
- Os resultados desta sondagem, ou o que se lhe quiser chamar, não representam absolutamente nada, nem é legítimo que se lhes chame, "estudo qualitativo".

E passo a explicar porquê:

Se a ideia era demonstrar que Sócrates é o culpado pela crise que se vive, então era essa a pergunta que deveria ter sido feita. Eles saberiam dizer, aí sim, sem margem para dúvidas, o que pensam a esse respeito.
E se, por outro lado, a ideia fosse demonstrar que os portugueses não gostam de Sócrates, nada como perguntar-lhes, directamente, sem rodeios. E eles responderiam, simplesmente, sim, ou não.
Em qualquer dos casos, aí sim, poderiam ser retiradas conclusões quanto aos resultados, atendendo à objectividade das perguntas.
Mas perguntar aos portugueses se consideram que a aprovação do PEC IV evitaria o pedido de ajuda externa, sem lhes perguntar, simultâneamente, se sabem o que era o PEC IV, e quais os efeitos das medidas nele previstas, na dívida pública, é, perdoem-me a expressão, "andar a brincar com coisas sérias".
Isto porque, existem fundados motivos para suspeitar que, nem metade dos inquiridos faz a mínima ideia do que era o PEC IV, tem noção do que é a Dívida Pública, ou conhece o que é o Produto Interno Bruto.
E jogar com a ignorância dos portugueses, com a finalidade de influenciar o resto da opinião pública, seja com que objectivo for, é feio, muito feio. Além de ser, éticamente, condenável.
Lembro-me, por exemplo, da enorme celeuma, e discussão, em torno do modo como estava formulada a pergunta sobre aborto, quando da realização do referendo, com o argumento de que as conclusões poderiam não corresponder à vontade dos portugueses.
Pois, meus amigos, este é um caso semelhante, com a única diferença de, neste inquérito, terem sido feitas perguntas, que são verdadeiros abortos, cujas respostas não permitem as conclusões que muitos gostariam.
Assim não vale...

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