quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

O FUNDO, NO FUNDO...


Futuros despedimentos serão pagos com desconto nos salários

Este é o título do artigo, assinado por Margarida Peixoto, que podemos ler na página do Diário Económico, na Internet (http://economico.sapo.pt/noticias/futuros-despedimentos-serao-pagos-com-desconto-nos-salarios_106880.html).

Face ao título, seria natural que a jornalista nos desse alguns detalhes sobre a operação que foi desenhada pelo Governo, visando a criação de um Fundo, para fazer face, parcialmente, aos custos com despedimentos.
Surpreendentemente, e apesar do título, não só isso não acontece, como, a este propósito, é dito o seguinte:

"O Governo quer as empresas criem um fundo para financiar os despedimentos que será alimentado através de um desconto na massa salarial, anunciou ontem a ministra do Trabalho. No final de uma reunião do Conselho de Ministros especialmente longa - durou cerca de seis horas - o Executivo apresentou um pacote de medidas para tornar a economia mais competitiva, sem deixar para trás o objectivo de cortar o défice orçamental."(...)

Desde logo, anota-se a falta de cuidado na redacção, pois o Governo não "quer as empresas criem", mas sim, quer que as empresas criem, mas enfim, acontece...
Ora, que me conste, a ministra não afirmou esse propósito, nos termos em que a jornalista lhe atribui, mas eu, que não tenho procuração da ministra, ou de quem quer que seja, para defender a solução encontrada, ou qualquer outra, posso ajudar a explicar.
Mas não sem, antes, acrescentar que, na madrugada de hoje, na RTP-N, a pretexto da revista de imprensa, dos jornais de hoje, um outro jornalista, e comentador, cujo nome não recordo, aproveitou o título da notícia para nos dizer que iríamos assistir ao absurdo de os trabalhadores passarem a efectuar descontos para assegurarem o dinheiro para o seu despedimento, o que funcionaria, em seu entender, uma espécie de "seguro".
Assim se vai fazendo o jornalismo em Portugal...
Vamos por partes:

1. O Governo anunciou a intenção de criar um Fundo, para financiar, parcialmente, futuros despedimentos, sem explicitar o modo como seria financiado, pois tem a intenção de discutir este projecto, em sede de concertação social;
2. As associações patronais acolheram favoravelmente, em princípio, esta iniciativa, tendo as centrais sindicais optado, a meu ver bem, por um prudente silêncio;
3. A criação de um Fundo desta natureza só fará sentido se for financiado pela entidade patronal, sem qualquer contribuição dos trabalhadores, como facilmente se percebe, e nunca a ministra referiu o que quer que fosse, em sentido contrário;
4. Claro que, para que o Fundo possa ser constituído, e atingir objectivo pretendido, será necessário incentivar as empresas nesse sentido, concedendo-lhes algum benefício;
5. Sucede que esse benefício, ou muito me engano, só poderá ser concedido por via da isenção fiscal, ou seja, até ao limite que vier a ser definido, as empresas beneficiarão de um crédito fiscal, total ou parcial, sobre montante que alocarem a esse Fundo.

Se for este o processo, e não vejo que possa ser outro, as empresas encontrarão no crédito fiscal a motivação para a constituição do referido Fundo, os trabalhadores não terão qualquer encargo adicional com o mesmo, nem faria sentido, e o Estado abdica de uma parte da receita para tentar assegurar uma maior flexibilidade, em matéria de despedimentos, e contratações.
Naturalmente que, como o Estado somos todos nós, serão os contribuintes quem acabará por financiar, ainda que de forma indirecta, o referido Fundo, mas essa é uma outra questão, e um outro debate.
O que não me parece razoável é que, com base nas notícias que se conhecem, se construam títulos de jornais tendentes a induzir em erro a opinião pública. E menos ainda quando se trata de um jornal especializado em questões económicas, que tem a obrigação de contribuir para o esclarecimento dos seus leitores, em vez de os baralhar, ainda mais.
A menos que exista uma intenção, deliberada, de criar embaraços ao Governo, como se os que existem não fossem suficientes, e a pretexto do referido Fundo tentar contribuir para afundar, ainda mais, a sua credibilidade...

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