Ironia do destino...
Neste mesmo dia, corria o ano de 1640, e os portugueses celebravam a sua libertação do jugo espanhol, enquanto agora celebram a entrada em vigor de um Tratado que reduz o peso dos pequenos estados, como Portugal, no processo europeu de tomada de decisão, e relativamente ao qual, 26 chefes de governo, incluindo o nosso, assumiram o compromisso de não o submeter a referendo, excepção feita á Irlanda, por motivos constitucionais...
Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades...
A UE passa, agora, a ter um Presidente da União, cooptado pelos chefes de governo, que representa "os povos", interna e externamente, por um período de 5 anos, mas que esses mesmos povos não terão o direito de eleger.
Mas Cavaco Silva, o nosso Presidente, considera que este é "um dia de esperança, para os europeus".
Haja, pois, esperança...
Também a partir de hoje, a UE tem um Ministro do Negócios Estrangeiros, eufemisticamente designado Alto Comissário, que será o seu porta-voz a nível internacional, com as suas embaixadas e o seu corpo diplomático. Aparentemente, a diplomacia portuguesa perde peso, na defesa dos seus interesses específicos.
Mas isso não parece ser coisa que incomode o nosso ministro Luís Amado...
Com a entrada em vigor do Tratado, o Conselho de Ministros da União passará a poder aprovar as suas decisões por "dupla maioria" ( pelo menos 55% dos Estados-Membros, o que corresponde a 15 em 27, que representem, no mínimo, 65% da população europeia), abandonando o sistema de "tripla maioria" do Tratado de Nice.
Mas José Sócrates, o nosso Primeiro-Ministro, considera que o Tratado "tornará a Europa mais forte"...
E Portugal, pergunto eu, cuja população representa pouco mais de 2% da população europeia, com tendência para diminuir ? Fica mais forte, ou mais fraco, no contexto da União ?
Resta-nos o consolo de que "todo o mundo é composto de mudança"...
Sou, quero afirmá-lo, a favor da União Europeia, mas não sou federalista, como já devem ter notado.
Mas porque sou português, e europeu, quero uma União cujas decisões resultem do máximo divisor comum dos interesses dos seus povos, no respeito pela identidade de cada um, e não da imposição da vontade dos mais fortes...
E é o reforço da posição dos mais fortes que, a meu ver, está consagrado neste Tratado, que muito poucos leram, na íntegra, incluindo eu, mas muitos se aprestaram a aclamar...
Natural é o regozijo dos burocratas europeus, para quem esta entrada em vigor é, seguramente, "motivo de grande orgulho", como afirmou o Presidente da Comissão, Durão Barroso, já que conseguiram, mais uma vez, o "grande avanço" de evitar que tenha sido reconhecido aos povos, que, supostamente, representam, o direito de se expressarem em referendo, com a conivência, é claro, dos governos dos respectivos países.
Porreiro pá !
Haverá sempre um "lugarzinho na União, como refúgio para os fracassos domésticos...
Afinal, se sempre coube ás elites assumir a liderança das grandes transformações históricas, porque haveria, agora, a populaça, de se querer intrometer em assuntos cuja compreensão os transcende?...
E é por isso que sempre fico surpreendido com a reacção dos políticos, e burocratas, face aos elevadíssimos níveis de abstenção, nas eleições europeias.
Com a construção da União Europeia entregue ao vanguardismo de alguns, num Continente que, não por acaso, o mundo, apelida de "Velho", que motivos tem um cidadão para participar num processo, em que a sua opinião não só não é pedida, como não é desejada ?
Embora sem aderir ao foguetório nacional, desejo, do coração, estar enganado, e faço votos para que a União Europeia possa reforçar-se, de facto, no respeito por todos os países, e povos, que a integram...
Para que os meus netos não tenham de aprender, nos manuais de História Universal, como uma promissora União entre países, e povos, na Europa, foi de vitória em vitória, até á derrota final...
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