Com o eclodir da crise económica, em todo o mundo, rapidamente, governos, partidos, comunicação social e opiniões públicas, se apressaram a eleger os "bombos da festa":
OS BANCOS e A SUPERVISÃO.
Claro que, aos governos, não coube culpa nenhuma, pois não é a eles que incumbe definir as "regras do jogo"...
Também os partidos, a partir dos quais se formam os governos, estão completamente isentos de culpa, pois sempre evitaram o convívio, e nunca de forma íntima, acentue-se, com os banqueiros...
A comunicação social, ainda menos, até porque, todos sabemos, os custos com publicidade, dos bancos, representam, apenas, uma pequena percentagem dos gastos globais, em publicidade, e os meios de comunicação nunca hesitaram em tratar um qualquer banqueiro como se de um cidadão comum se tratasse...
Resta a opinião pública, a qual, não fazendo a mínima ideia do que é isso da supervisão, nem como funciona, atribui a culpa aos bancos, que lhe aumentam a taxa de juro do crédito à habitação, ou a prestação do automóvel, quando "a televisão" diz que a Euribor está a descer.
A pretensão deste modesto escriba, é, apenas, a de colocar à disposição de quem se der ao trabalho de o ler, uma reflexão sobre o tema da crise, numa perspectiva diferente.
Para tanto, proponho que esta análise se submeta ao princípio de uma velha máxima:
" A César o que é de César, a Deus o que é de Deus"
Aceite o príncípio, comecemos por lembrar que, os Bancos são entidades abstractas, pelo que não podem ser responsabilizados por coisa nenhuma! Os banqueiros sim, podem, e devem!
Mas não deixa de ser curioso que se fale muito de Banca e pouco de banqueiros....
E também não será demais recordarmos, que a confiança no sistema financeiro exige, e tem subjacente, que o exercício da actividade financeira esteja confiado a pessoas de inquestionável idoneidade.
Mas o sistema é servido por Homens, com todas as suas qualidades e defeitos , as suas forças e fraquezas, pelo que se torna necessário garantir, em caso de deliberado incumprimento, como a ocultação de informação à entidade supervisora, que as penas a aplicar são severas, e adequadas à gravidade dos casos ( não sei, admito, se a sonegação de informação às entidades de supervisão configura um crime, mas defendo que o seja).
E não menos importante, é reconhecermos que, as culpas dos banqueiros nesta crise, e elas existem, não se esgotam na ocultação da informação, ou num, eventual, enriquecimento ilícito, como parecem ser os casos do BPN e do BPP, o que explica a o seu interesse mediático.
Tomemos, então, outra perspectiva, e recordemos a época em que se começou a falar de "produtos bancários"....
Estavam a surgir os "derivativos", ou "produtos derivados", os "fundos", e os "fundos de fundos", solução que os banqueiros encontraram para aumentarem a rendibilidade dos seus Bancos, melhorarem a retribuição dos accionistas, nalguns casos, eles próprios, e libertarem capital para a concessão dos novos créditos.
No caso dos fundos, e dos fundos de fundos, a colocação de unidades de participação tornou-se prioritária, mas os banqueiros sabiam, como sabem, que a maior parte dos funcionários, que integram as respectivas redes de balcões, não tinha, nem tem, condições para perceber o risco associado a estes produtos, quanto mais para os explicar aos clientes...
Mas era preciso vender, e a formação dos vendedores acabou por se resumir à distribuição de fichas, com as "características de cada produto", precedida, quando possível, de uma reunião com os "chefes dos vendedores" que, no sector financeiro, se designam, normalmente, por "gerentes" ou "directores de balcão".
Garantir que ninguém venderia uma unidade de participação a um cliente, sem saber o que estava a vender, e que nenhum cliente compraria uma unidade de participação de um fundo, sem ser, previamente, esclarecido do risco em que incorria, obrigaria a atrasar, por um longo período, o lançamento desses produtos.
Mas não havia tempo a perder, até porque as exigências com o cumprimento dos rácios estava a aumentar...
Aceite este "risco", por parte dos banqueiros, fixaram-se os "objectivos para a Rede", e um substancial conjunto de ignorantes, nesta matéria, obviamente, passou, de um dia para o outro, a "recomendar" aos seus clientes, que aplicassem as suas poupanças em produtos de risco, que não entendiam ,nem sabiam explicar, mas que tinham a "obrigação" de vender, ou lá se ia o "prémio de produtividade".
A credibilidade que lhes dava o facto de estarem ao serviço de uma instituição financeira encarregar-se-ia do resto...
Este processo, que se iniciou muito antes da eclosão desta crise, e que tantas dores de cabeça já tinha dado, de cada vez que as bolsas tinham um comportamento negativo, foi sendo sofisticado, pelos mesmos banqueiros, e as consequências estão à vista de todos.
Mas, repito, os Bancos, entidades abstractas, não tiveram, nem podiam ter, nada que ver com o que se passou !
Apenas sucede que, acusar um banqueiro de provocar uma crise, ou responsabilizá-lo pelo incumprimento da lei, não faz parte da nossa "tradição".
Obrigação de cumprir a lei, sob pena de pesada sanção, é coisa para pequeno comerciante, para pequeno empresário, enfim, para "pobre", como lembrava Miguel Falabela, naquela notável série, "Sai Debaixo".
A menos que, "a coisa" atinja uma dimensão tão óbvia, que não se torne mais possível ignorar, e, nesse caso, o melhor será permitir ao infractor um tranquilo afastamento, para não "desestabilizar a Instituição". De preferência, com uma reforma a condizer com os serviços prestados !
Só que, no caso vertente, a dimensão da crise obrigava a encontrar encontrar responsáveis !
Os Bancos, ainda que entidades abstractas, serviam, só que não era suficiente...
E mesmo "à mão de semear", para partilhar culpas e desviar as atenções do essencial, estava, a Supervisão, outra entidade abstracta, mas cujas atribuições tornavam fácil o seu envolvimento no processo...!
Afinal, não seria difícil explicar que, era ao organismo de supervisão que incumbia descobrir os banqueiros que lhe ocultavam informação, escondiam os prejuízos em empresas "offshore", vendiam produtos de elevado risco, como se depósitos a prazo se tratassem, ou colocavam, acções e fundos, nas carteiras dos clientes, sem o seu prévio consentimento, ou sem sua expressa autorização.
E, a avaliar pelos resultados, não se enganaram...!
Atrevo-me mesmo a dizer que, uma leitura, desapaixonada, do que se tem vindo a passar, permite concluir que, a culpa não é de quem se apropria do que não lhe pertence, de quem engana, de quem mente, de quem induz os outros em erro, aproveitando-se da sua ignorância!
A culpa é de quem é parvo, e se deixa enganar, porque todos sabemos que "de boas intenções está o inferno cheio", todas as actividades comportam um risco, e "a ignorância da lei, não aproveita a ninguém".
Criada para supervisionar, a Supervisão, deveria "obrigar" os banqueiros a serem sérios, a não mentirem e a comportarem-se de acordo com as exigências, mínimas, da profissão que exercem.
E nem o Governador do Banco de Portugal escapou ! Pelo contrário, tornou-se num dos principais alvos das críticas, mas isso não teve, estou certo, nenhuns motivos políticos...!
Ao ouvir alguns banqueiros, para "sacudirem a água do capote", a propósito do chamado "caso BPN", atribuírem, na Assembleia da República, responsabilidades ao sistema de supervisão, e ao Banco de Portugal, que também as teve, embora longe da dimensão que lhe pretendem atribuir, só me ocorre uma expressão bíblica, para caracterizar tudo isto:
Perdoai-lhes Senhor, que não sabem o que fazem !
E fico a reflectir sobre a origem da expressão, "existem razões que a razão desconhece"...
Mas o importante é que haja "bombos", e que se faça a "festa"....e "seja o que Deus quiser..."!
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